HIPNOSE E ODONTOLOGIA - Uma solução para o medo, a ansiedade e a dor
- Charton Baggio Scheneider
- 23 de jul.
- 6 min de leitura

O uso da hipnose na odontologia é amplamente desconhecido pelos especialistas, especialmente no Brasil. No entanto, evidências experimentais demonstram sua eficácia e utilidade tanto para o dentista quanto para seus pacientes.
O consultório odontológico é frequentemente associado a experiências desagradáveis. A pior delas talvez seja a dor, mas também devemos considerar, entre outras, a sensação de estar à mercê de alguém¹, o desconforto causado pelo contato com os instrumentos e o reflexo de vômito que eles podem provocar. Estudos epidemiológicos mostram que cerca de 75% dos pacientes odontológicos sentem medo, 10 a 15% sentem ansiedade e 20% deles relatam até sintomas físicos ligados ao desconforto²⁻⁵. Essas características colocam os pacientes em risco de faltar às consultas, adiar exames de rotina ou, na melhor das hipóteses, encarar o atendimento odontológico com estresse intenso que, além de dificultar a intervenção, pode reforçar comportamentos de evitação⁶. A hipnose, ao atuar sobre ansiedade, dor e habilidades de gerenciamento de estresse, torna os pacientes mais colaborativos e permite ao especialista trabalhar em um contexto mais favorável.
Uma pesquisa realizada durante intervenções orais e maxilofaciais⁷ relata que pacientes tratados com hipnose antes das consultas apresentaram — em comparação a um grupo controle — reduções de estresse. Isso fica evidente tanto do ponto de vista comportamental quanto na ativação do sistema nervoso simpático; os pesquisadores, de fato, relataram um melhor estado de relaxamento e uma maior sensação de bem-estar associada ao atendimento odontológico, que se manteve ao longo do tempo. Esses resultados apoiam o que já havia sido observado em pesquisas anteriores: aplicar técnicas hipnóticas no ambiente odontológico, para melhorar a percepção do consultório e do próprio dentista, reduz os níveis de ansiedade e favorece a assiduidade às consultas.
Em outras palavras, a hipnose, ao facilitar o trabalho do dentista, pode melhorar a experiência psicológica dos pacientes, promovendo sua saúde bucal. Esse efeito pode ser reforçado com o controle da dor relacionada ao procedimento por meio da hipnose. Uma pesquisa recente⁹ foi conduzida com um grupo de pacientes com hipersensibilidade dentinária, uma condição que caracteriza indivíduos que sentem dor intensa quando seus dentes são expostos a diferentes tipos de estímulos: térmicos, osmóticos, químicos ou táteis¹⁰. Ao comparar grupos de indivíduos submetidos a diferentes tipos de terapias dessensibilizantes, os pesquisadores encontraram na hipnose uma alternativa eficaz aos protocolos atualmente utilizados — como a fluoretação ou tratamentos à base de substâncias dessensibilizantes — obtendo, já na primeira semana após o início do tratamento, uma redução da dor percebida que também durou mais tempo do que com outras técnicas. Além disso, a eficácia não estava relacionada aos níveis de estresse dos pacientes e foi associada a maiores índices de satisfação com o tratamento.
Esse efeito também pode ser usado para favorecer a recuperação pós-operatória. Um exemplo dessa aplicação pode ser encontrado em um grupo de pacientes aos quais a hipnose foi proposta como forma de lidar com a dor causada por extrações de molares¹¹: comparado a um grupo tratado com procedimentos padrão, os indivíduos expostos à hipnose relataram, juntamente com uma notável redução da ansiedade durante a intervenção, uma grande diminuição no uso de analgésicos após a operação.
Também há evidências sugerindo que a hipnose pode ser útil para reduzir sangramento, frequência de infecções¹²⁻¹³, tempo de recuperação¹⁴ e, portanto, o tempo de internação hospitalar em casos de intervenções complexas¹⁵⁻¹⁶.
Como sugerem as evidências apresentadas, juntamente com outros resultados experimentais, podemos inferir que a hipnose pode ser útil aos dentistas, especialmente no tratamento de pacientes “sensíveis”, como aqueles com reflexo de vômito intenso¹⁷⁻¹⁹, pacientes com fobia odontológica²⁰⁻²², previamente traumatizados²³ ou crianças.
Pesquisas recentes parecem ter se concentrado em pacientes pediátricos e, além de confirmar os resultados quanto à redução dos níveis de ansiedade em pacientes adultos, demonstram que a hipnose pode ser útil durante fases específicas de intervenções que as crianças experimentam como estressantes. Em uma pesquisa realizada em 2011²⁴, pesquisadores da Universidade de Rennes utilizaram a hipnose para ajudar crianças a superarem o medo das agulhas utilizadas para anestesia. Em 19% das crianças (e 10% dos adultos), isso se torna uma verdadeira fobia. Em casos extremos, pode-se recorrer à anestesia geral, embora ela nem sempre resolva o problema, exija supervisão médica, tenha um custo elevado e seja difícil de integrar à rotina do atendimento odontológico²⁵⁻²⁷.
Os resultados do estudo, que comparou um grupo de crianças expostas à hipnose com um grupo controle, mostraram que a hipnose aumentou o limiar de dor, reduzindo assim a intensidade da dor e aumentando o número de pacientes que não sentiram nada. Esses efeitos são estáveis e podem ser acompanhados por redução do choro, de comportamentos de resistência e por uma diminuição geral da excitação fisiológica²⁸.
A hipnose também pode ser usada para favorecer a adesão de crianças a projetos terapêuticos de longo prazo, como aqueles que envolvem o uso de aparelhos ortodônticos — que são muito melhor tolerados por crianças que passaram por tratamento hipnótico.
Concluindo, técnicas ultrarrápidas também podem ser utilizadas no ambiente odontológico para promover o bem-estar e uma rotina de cuidados bucais equilibrada e contínua.
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